Tal qual mãe rigorosa, a vida o arrancou da cama quente em dia frio e chuvoso. Sua indignação foi grande, pois ele havia trabalhado arduamente para merecer aquele descanso. Largou-se no piso gélido, preferindo congelar-se a entregar-se às exigências dela. Não demorou muito e uma sensação glacial penetrava seus ossos. Como bicho acuado, escondeu-se debaixo da cama. Num encolhimento dolorido, insultava a mãe vida elogiando a mãe morte.
Com seu olhar limitado pelo esconderijo, conseguia visualizar os passos da mãe vida. “Que ela se vá! Que ela se vá!” O vento cruel entrava pela janela e, sorrateiro, beijava todo o corpo dele já congelado fora de sua cama aquecida. Talvez, fosse mesmo melhor aguardar a mãe morte chegar. Ela o libertaria das garras implacáveis da mãe vida. Ela o recolocaria de volta aos cobertores macios, fecharia as janelas, o vento cessaria, a escuridão invadiria, trazendo o conforto que ele tanto queria.
Ah… O conforto! Como ele suplicava pelo conforto que a mãe vida estava lhe arrancando. Ele tinha certeza do tanto que merecia estar confortável. Até que, finalmente, a mãe morte chegou. Nesse momento, com um grito espasmódico, ele suplicou pela mãe vida. Ela, imediatamente, surge com uma xícara fumegante que lhe enche de alento o corpo recém-congelado.
Altivo e corajoso, ele abriu a porta de seu quarto, deparando-se com um lindo dia ensolarado e convidativo. A mãe vida lhe arrancara da cama implacavelmente. A mãe vida lhe dera a vitalidade. Não é que a mãe vida é realmente feita de amor e rigor!?
______________________________________
Foto by MARCOS LALLI
Comments: no replies