site logo
  • Home
  • Identidade
  • Pessoas
  • Categorias
    • Arte
    • Ciência
    • Crônica
    • Cultura
    • Educação
    • Poesia
    • Políticas Públicas
    • Tecnologia
  • Crônicas Marcianas
Homepage > Categorias > Arte > Westworld e a chegada da verdadeira I.A.
28/06/2018  |  By Sérgio Kulpas In Arte, Cultura

Westworld e a chegada da verdadeira I.A.

wwsergio-1170x658

(Leitura livre: o texto não contém spoilers relevadores sobre a série de TV da HBO)

O escritor americano de ficção-científica Bruce Sterling disse em uma entrevista que “a ficção-científica não prevê o futuro – ela PROGRAMA o futuro”. Podemos entender a boutadede Sterling como a sugestão de “causalidade reversa”: o futuro não pode ser previsto, mas é influenciado por ideias do presente, por visões e especulações que acabam eventualmente se materializando.

Há muitos exemplos de como a F.C. “programa” o futuro, desde os primeiros autores do gênero, ainda no século 19. Jules Verne e H.G. Wells foram autores que anteciparam várias tecnologias e situações: do submarino ao videofone e os computadores onipresentes, muito tempo antes que essas tecnologias se tornassem realidade. É claro que os autores de F.C. não possuem poderes sobrenaturais, mas são artistas dotados de imensa sensibilidade e capacidade de imaginação. São mulheres e homens capazes de descrever impérios galácticos, civilizações extraterrestres, viagens no tempo — com grande talento e riqueza de detalhes. Por outro lado, nenhuma autora ou autor de décadas atrás foi capaz de antecipar algumas tecnologias do nosso cotidiano, como a internet ou o iPhone.

Um tema muito caro para a ficção-científica é a noção de inteligência artificial. Há muitas décadas os escritores contam histórias sobre “cérebros eletrônicos”, sistemas tão sofisticados que acabam por atingir a autoconsciência. A partir dessa premissa (“coisas que pensam”), inúmeros cenários podem ser traçados. Grosso modo, as especulações se dividem em três categorias básicas. Na categoria “apocalíptica”, as máquinas inteligentes se rebelam contra os criadores humanos e iniciam uma guerra contra nós – é a categoria mais popular, porque permite narrativas cheias de ação e conflitos. Na categoria “avatar do bem”, a I.A. assume o papel de guardiã da humanidade, ajudando a espécie humana a superar obstáculos ou, de modo mais pedestre, permitindo entretenimentos digitais mais sofisticados. E há a categoria “estranha”, onde a I.A. não reconhece a relação “parental” com a humanidade, e não pode ser compreendida por nós – segue seu destino de modo próprio, indiferente aos seus criadores.

Diferentemente de temas como viagens acima da velocidade da luz ou máquinas do tempo, a inteligência artificial é um campo acadêmico real, estabelecido há mais de meio século. O famoso matemático Alan Turing, pioneiro da computação moderna, especulou sobre a questão das máquinas capazes de pensamento autônomo na primeira metade do século 20. O termo “inteligência artificial” foi cunhado pelo cientista americano John McCarthy em 1956. Desde então, vários cientistas e suas equipes contribuíram para o desenvolvimento dessa área em várias universidades do mundo.

Atualmente, a inteligência artificial se tornou a bola da vez da indústria digital. Empresas como Google, Facebook, Apple, Amazon e outras gigantes da tecnologia estão investindo bilhões de dólares em sistemas capazes de realizar tarefas complexas sem assistência humana, tomando decisões cruciais a partir de complexos algoritmos. Essas empresas veem o potencial da I.A. para oferecer uma grande variedade de serviços altamente lucrativos. Governos também testam sistemas de I.A. para automatizar tarefas complexas, e as forças armadas de muitos países também investem em projetos de inteligência artificial em suas operações militares, desde o planejamento estratégico até a operação de armamentos.

O fato de que grandes corporações, governos (democráticos ou não) e exércitos se mostrarem encantados com as possibilidades da I.A. nos remete à categoria mais preocupante das especulações, o “apocalipse robótico”.

Cientistas de peso, como Stephen Hawking, e magnatas de tecnologia, como Elon Musk, declararam de modo veemente que as I.A.s não podem se desenvolver sem controles rígidos, sem salvaguardas que impeçam que esses sistemas evoluam por conta própria – isso poderia representar o fim da espécie humana. Em seu excelente romance “Neuromancer”, de 1984, o autor William Gibson imagina uma “Turing Police”, uma espécie de Interpol dedicada a impedir que as I.A.s se tornem independentes demais.

O “robô inteligente” é tão frequente nas obras de ficção que se tornou um ícone da cultura popular. Na grande maioria dos casos, esses sistemas ou androides inteligentes são descritos como antagonistas – pelo mero fato de que uma boa história necessita de conflito e confronto para manter o interesse do leitor ou espectador.

Na série “Westworld”, esse conflito/confronto está presente e é responsável por boa parte do sucesso do programa. A “rebelião das máquinas” contra os criadores humanos também aparece na versão original, o filme de 1973 escrito e dirigido por Michael Crichton (que também escreveu “O Enigma de Andrômeda” e “Jurassic Park”), com Yul Brynner no papel principal. No filme dos anos 70, um defeito inexplicável leva o parque de diversões futurista ao apocalipse, onde os robôs-anfitriões passam a matar os visitantes.

Na série atual da HBO, ocorre o contrário, apesar das semelhanças. Por defeito ou intenção consciente, os androides ganham autoconsciência, o que leva à “gênese” de uma nova espécie. Na história original, os androides são puramente mecânicos, enquanto na série atual eles são um prodígio da engenharia biomecânica – do mesmo modo que replicantes no romance de Philip K. Dick eram autômatos, e se tornaram organismos geneticamente construídos, indistinguíveis de um ser humano no filme “Blade Runner”.

Como a humanidade lidaria de fato com a responsabilidade, o ônus e a culpa de gerar uma nova espécie inteligente, “à sua imagem e semelhança”? Os humanos não são deuses, mas seriam capazes de criar uma nova espécie consciente por mero acidente?

Usando o pretexto de um conflito sangrento entre criadores e criaturas (ideia que já completou 200 anos, desde que Mary Shelley escreveu “Frankenstein”), a série de TV discute temas muito complexos e sutis, com amplas citações eruditas (de Plutarco a Shakespeare), e atinge patamares raramente vistos em uma produção “pop” para televisão. A pergunta de Philip K. Dick, “Os androides sonham com ovelhas elétricas?” é aqui expandida de modo grandioso, no limite da metafísica: “Criaturas artificiais têm alma?”.

 

Related Posts

  • 35 anos de um segundo advento35 anos de um segundo advento
  • As moedas do século 21, parte 2As moedas do século 21, parte 2
  • Sobre a singularidadeSobre a singularidade
  • O Inevitável, parte 1O Inevitável, parte 1
  • Devaneios de Westworld – 2.9Devaneios de Westworld – 2.9
  • Pets da IAPets da IA
frankesntein inteligência artificial neuromancer philip K Dick stephen hawking westworld william gibson

Article by Sérgio Kulpas

Previous StorySou do exagero
Next StoryResiliência

Comments: no replies

Join in: leave your comment Cancel Reply

(will not be shared)

Ficha de Inscrição

Receba nossa newsletter

* campos obrigatórios




Mais lidos

  • A base conceitual e a história do multiculturalismo (15.533)
  • A vida é tão rara! (8.552)
  • A mente humana é um quarto 1408 (7.857)
  • O Inevitável, parte 1 (7.796)
  • O dicionário dos sofrimentos obscuros (5.197)
  • Neurônios apaixonados (5.054)
  • Devaneios de Westworld – 1.10 (4.934)
  • A população de Campinas (4.781)
  • Orgulho e Vaidade (4.709)
  • Calma, não é um tubarão! (3.802)

Related Posts

  • 35 anos de um segundo advento35 anos de um segundo advento
  • As moedas do século 21, parte 2As moedas do século 21, parte 2
  • Sobre a singularidadeSobre a singularidade
  • O Inevitável, parte 1O Inevitável, parte 1
  • Devaneios de Westworld – 2.9Devaneios de Westworld – 2.9
  • Pets da IAPets da IA

Arquivos:

  • agosto 2021 (1)
  • abril 2021 (1)
  • março 2021 (1)
  • fevereiro 2021 (2)
  • novembro 2020 (1)
  • agosto 2020 (2)
  • julho 2020 (2)
  • junho 2020 (4)
  • maio 2020 (2)
  • abril 2020 (7)
  • março 2020 (3)
  • fevereiro 2020 (3)
  • janeiro 2020 (2)
  • dezembro 2019 (1)
  • maio 2019 (5)
  • abril 2019 (5)
  • março 2019 (5)
  • fevereiro 2019 (3)
  • janeiro 2019 (8)
  • dezembro 2018 (3)
  • novembro 2018 (6)
  • outubro 2018 (11)
  • setembro 2018 (1)
  • agosto 2018 (8)
  • julho 2018 (7)
  • junho 2018 (10)
  • maio 2018 (13)
  • abril 2018 (9)
  • março 2018 (12)
  • fevereiro 2018 (10)
  • janeiro 2018 (15)
  • dezembro 2017 (12)
  • novembro 2017 (15)
  • outubro 2017 (17)
  • setembro 2017 (19)
  • agosto 2017 (23)
  • julho 2017 (17)
  • junho 2017 (18)
  • maio 2017 (12)
  • abril 2017 (12)
  • março 2017 (17)
  • fevereiro 2017 (13)
  • janeiro 2017 (8)
  • dezembro 2016 (16)
  • novembro 2016 (16)
  • outubro 2016 (15)
  • setembro 2016 (19)
  • agosto 2016 (20)

Sobre o Confrariando

O Contrariando é um grupo formado por um bando de doidos masoquistas cujo fetiche é uma combinação entre o excesso de trabalho e a falta de dinheiro. Inquietos com as míseras 18 horas de atividades profissionais e acadêmicas diárias, eles resolveram se unir e gerar mais algumas horinhas de serviço semanal para si mesmos.

Categorias

  • Arte (74)
  • Categorias (6)
  • Ciência (26)
  • Cinema (3)
  • Crônica (188)
  • Crônicas Marcianas (18)
  • Cultura (159)
  • Educação (22)
  • Literatura (55)
  • Música (6)
  • Poesia (8)
  • Política (50)
  • Políticas Públicas (12)
  • Tecnologia (47)
  • Televisão (2)
  • Uncategorized (58)

Buscar no Confrariando

Posts Recentes

  • Conexão
  • Turra ideológica
  • 300 mil mandarins
  • O pássaro
  • Os Outros
Copyright, Copyleft, Copyup e Copydown 2016 by Curatellos. Todos os direitos reservadinhos que só eles...
Forum