Dando sequência à análise do livro The Inevitable – Understanding the 12 technological forces that will shape our future, de Kevin Kelly, continuamos a observar as macrotendências que direcionarão a tecnologia e as relações sociais com a tecnologia nas próximas três décadas. Essa a é a segunda parte da resenha, e a parte 1 está aqui.
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Se a cultura já revolveu em torno da palavra falada na antiguidade e dos livros a partir do Renascimento, recentemente ela revolve mais e mais em torno da tela digital. Grande ou pequena, privada ou pública, a tela dos dispositivos digitais comanda nossa atenção. Essa macrotendência já está provocando profundas mudanças no mundo à nossa volta, e o futuro guarda duas transformações ainda mais profundas, provocadas por essa predileção pela tela:
- Em primeiro lugar, a palavra escrita continuará escrita, mas o meio — resmas de papel limitadas por capas duras, brochuras e que tais — tende a mudar sobremaneira. Os mais analógicos, que se apaixonam pelo cheiro de um livro novo, e que olham com alegria e orgulho para uma biblioteca formada ao longo de vários anos, vão discordar, mas a conveniência de se carregar o equivalente a várias bibliotecas em um dispositivo que cabe na mochila, e de se acessar praticamente qualquer material escrito que se queira onde quer que se esteja, vai se sobrepor à tradiçã De maneira semelhante, outras formas de comunicação visual vão migrar para as telas de dispositivos digitais pessoais, em especial as produções antes limitadas à televisão e ao cinema. Já fazemos isso hoje, e essa tendência só fará aumentar nas décadas à frente, transformando profundamente a natureza e o inter-relacionamento dos textos que lemos em nosso dia-a-dia.
- Em segundo lugar, o conceito de “tela” vai se expandir com esse tipo de dispositivo, podendo ocupar qualquer superfície plana nos locais que frequentamos. Além disso, os dispositivos de realidade virtual (que substituem o que vemos por outro cenário) e de realidade aumentada (que complementa o que vemos com outras informações visuais) tendem a trazer o conceito de “tela” para dentro de nossos olhos, desacoplando-os das telas fí O acesso à informação tende a ser ubíquo, acompanhando-os e praticamente todos os momentos que estivermos de olhos abertos ao longo de nosso dia.
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Kelly começa a falar deste tópico lembrando a observação de um articulista do site TechCrunch:
- O Uber, a maior empresa de táxi do planeta, não tem sequer um veículo ;
- O Facebook, o maior veículo de conteúdo do mundo, não produz qualquer conteúdo;
- O Alibaba, o mais valioso varejista do mundo, não tem absolutamente nenhum estoque de produtos.
- O AirBnB, o maior provedor de acomodação do planeta, não tem sequer um imóvel em seu nome.
No caso da mídia digital, o caminho é o mesmo: O Netflix não possui filmes, o Spotify não detém direitos de música, e por aí vai. A tônica é clara: a “posse” (ou a falta dela) não é empecilho para a realização de negócios ou para a criação de impérios.
A mesma tendência começa a fazer parte da realidade de qualquer cidadão, e vamos substituindo a posse pelo acesso. Vamos transformado o produto em serviço.
É interessante que três dos quatro impérios citados acima, Uber, Alibaba e AirBnB, surgiram da transformação de serviços baseados em produtos em serviços baseados em serviços. Não é o taxi, mas sim a capacidade de transportar com conforto e segurança o cliente de A até B. Não é o estoque, mas sim a capacidade de fazer com que o produto desejado chegue até as mãos do cliente pelo menor preço possível, em um tempo adequado. Não é o hotel, mas a capacidade de acomodar o cliente com conforto, conveniência e segurança, a preços adequados.
Kelly acredita que esse e conceito tende a se expandir cada vez mais, trazendo como resultado uma vida com maior conveniência, sem as dificuldades impostas pela obsolescência ou pela manutenção.
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Essa é a macrotendência que nos dá a falsa impressão de que o futuro já chegou, mas que (na visão de Kelly), ainda está brutalmente longe de seu potencial. É fato que a Internet — e em especial a Web — nos permite compartilhar “coisas” numa taxa muito maior do que em tempos passados; é fato que a imensa “máquina de xerox” que é a Internet faz com que inúmeras cópias do que cair nela sejam passadas para frente o tempo todo, num compartilhamento sem fim (e nem sempre na legalidade). Sim, isso já ocorre. Mas isso, no raciocínio do autor, é só o começo do começo. Com todo o compartilhamento que fazemos, estamos a menos de 20% do potencial.
Para se ter uma ideia, o número de fotografias compartilhadas nas principais redes sociais em uso — Facebook, Instagram, Flickr e Snapchat — ultrapassa 1,8 bilhão por dia. Esse é o princípio do processo.
O próximo passo é a cooperação: agentes (pessoas, sites, comunidades) agregam e organizam esse manancial absurdo de fotos, de forma que possamos fazer uso destas. Quer uma foto da Torre Eiffel? Claro que você pode tirar uma (ou 273) quando for a Paris, mas o fato é que existem centenas de milhões de fotos de todos os ângulos daquele monumento, e certamente você vai encontrar várias do ângulo, hora do dia e condição do céu que precisa. A cooperação dos agentes agregadores garante isso.
Mais à frente temos a colaboração. Ela ultrapassa os limites da cooperação, porque permite não só a agregação de conteúdo, mas a interação de todos os participantes com todos os conteúdos. No exemplo das fotos, temos os memes que surgem e se multiplicam com algumas das fotos que “caem na rede”: qualquer um pode pegar uma foto, usar a criatividade, e criar um meme. Qualquer um pode juntar várias fotos no Photoshop e criar uma imagem nova. Outro exemplo — talvez o exemplo mais contundente de colaboração — é a comunidade Linux, que há décadas refina o sistema operacional de mesmo nome, disponibilizando os resultados a quem queira utilizá-los. Na esteira do Linux, vários outros projetos de colaboração comunitária existem, disponibilizando recursos gratuitamente para quem esteja disposto a encontrá-los.
É nesse sentido, da colaboração, que estamos apenas no começo da macrotendência do compartilhamento: no futuro tenderemos a compartilhar, cooperar e colaborar com tudo e mais um pouco que for produzido em termos de conteúdo digital.
Mas por que temos essa tendência de “colaborar”, que essencialmente significa “trabalhar de graça”? Por que, por exemplo, centenas de milhares de programadores ao redor do mundo dedicam horas e horas de seu tempo para produzir software para a comunidade Linux, sem receber um tostão por isso? Bem, no caso do Linux, a maioria dos usuários de fato utiliza e se beneficia dos produtos gerados. Há também outro fator: ao trabalhar no projeto da comunidade, os colaboradores recebem críticas e sugestões de seus pares, melhorando sua capacitação. Podem em seguida, por exemplo, desenvolver seus próprios aplicativos que vendem em lojas virtuais, ganhando dinheiro com seus esforços. Muitos dos desenvolvedores de aplicativos móveis para iOS e para Android começaram desenvolvendo na comunidade do Linux.
Filtrar
Não é difícil perceber que nunca houve melhor momento na História da Humanidade para se escolher material de leitura, filmes para assistir, música para ouvir, arte para apreciar. Temos uma vasta coleção de clássicos em todos os campos de atividade artística, e mais um volume inimaginável sendo produzido anualmente. A cada 12 meses, segundo dados oferecidos por Kelly, temos 8 milhões de músicas novas, 2 milhões de livros, 16.000 novos filmes, 30 bilhões de postagens em blogs, 182 bilhões de tweets, e 400.000 novos produtos. Em suma, o que não falta é variedade.
O problema é que é fácil nos perdermos em meio a tanta variedade. É fácil por exemplo, em meio a tantos novos lançamentos, deixarmos escapar uma música que nos agradaria ou ler um livro que “explodiria nossa cabeça”.
Para endereçar esse problema, Kelly antecipa que melhoraremos muito nossa capacidade de filtrar o conteúdo a que temos acesso, permitindo-nos um balanço saudável entre consumo daquilo que certamente nos agrada (visitas regulares ao Confrariando, por exemplo, pois aqui sabemos que tem conteúdo de qualidade), com descobertas de novos materiais que têm boas chances de nos agradar também.
Esta capacidade de filtragem já existe de forma incipiente, e melhora a cada dia que passa. Aquela seção em um site que afirma algo na linha de “usuários que viram o presente conteúdo também gostaram de…” é um exemplo deste tipo de filtragem.
No futuro, dada a abundância de material frente à nossa inerente escassez de tempo, os mecanismos de filtragem terão um papel crucial em nossas vidas — muito mais até do que o importante papel que já desempenham —, facilitando e guiando nosso acesso àquilo que realmente torna nossas experiências mais ricas.
Remixar
Esse neologismo, presente em nossa língua desde os tempos das gravações analógicas de áudio, é aplicado a cada vez mais campos do conhecimento e das artes, e no futuro será uma grande força a impulsionar o progresso. Kelly nos informa que o economista Paul Romer, da Universidade de Nova York, postula a teoria de que o crescimento econômico não emerge da descoberta ou criação de novos recursos, mas sim do rearranjo dos recursos existentes, tornando-os mais valiosos.
Um exemplo bastante claro deste fenômeno é o iPhone, o smartphone da Apple. Quando surgiu no mercado, o iPhone foi acusado de não trazer nenhuma inovação — uma injustiça, claro, mas uma injustiça bastante compreensível. Todos os componentes presentes no iPhone já existiam em outros dispositivos: tela sensível ao toque, câmera fotográfica integrada, capacidade de executar software, software complementando as funções de telefonia, acelerômetro, GPS, acesso à Internet, e por aí vai. Nada, absolutamente nada de novo. Contudo, foi o suficiente para iniciar uma revolução. Nos dias de hoje, em que pese não ter nem 20% do mercado mundial de smartphones, o iPhone fica com 92% dos lucros gerados por este mercado. Isso, repita-se, sem criar nada de novo.
A fórmula da Apple é simples, efetiva, e copiada por inúmeras empresas pelo mundo afora: pegar o que já existe e utilizar de maneiras novas ou utilizar de maneira melhor do que o que já existe. A bem da verdade, não foi a Apple que inventou essa mecânica: ela é apenas uma empresa que se especializou em agir desta forma.
A própria macrotendência “Cognificar”, já tratada no livro e nessa resenha, é um exemplo de remixagem: toma-se um elemento qualquer existente, seja hardware, software ou mesmo algum elemento não digital, e adiciona-se Inteligência Artificial (IA): faz-se uma remixagem do elemento com IA , tornando-o mais valiosos, mais adequado à realização das tarefas para as quais foi criado.
Nesse sentido, vale a antiga máxima: “os pioneiros ficam com as flechas, os posseiros ficam com a terra”, isto é, o valor maior não está necessariamente em criar o novo, mas sim em adaptar o novo, em encontrar novos usos para o novo, em melhorar o novo.
Poucos exemplos recentes de remixagem são tão eloquentes quanto o Mash-Up de 66 filmes musicais antigos com cenas de dança, remixados ao som de Up-Town Funk, na voz de Bruno Mars:
[arve url=”https://www.youtube.com/watch?v=M1F0lBnsnkE” align=”center”/]
Os filmes em si são excelentes, claro, mas quem não consegue enxergar a genialidade desta produção, a precisão do corte e da sincronização das cenas, o valor agregado em termos de entretenimento pela união majestosa de música e vídeos que não foram originalmente criados para “funcionarem” juntos, precisa rever seus conceitos.
Interagir
No início da era da Internet, as grandes empresas de mídia do planeta — os canais de televisão, as gravadoras, os estúdios de cinema, os periódicos, as editoras, e por aí vai — desdenharam do potencial da nova tecnologia. No raciocínio deles o consumidor de seus produtos (filmes, séries, notícias, textos, músicas…) estava mesmo a fim de consumir, e jamais colocaria a mão na massa para produzir conteúdo.
Ledo engano.
O internauta transformou-se na máquina produtora que impulsiona a Internet. Centenas de milhões de usuários no mundo todo produzem conteúdo diariamente, e a prova mais simples de ser enxergada desse fenômeno é o crescimento estarrecedor das receitas do Facebook: milhões de compartilhamentos de status ocorrem por segundo nas páginas da maior das redes sociais.
Sim, interagimos e não só consumimos. E cada vez mais queremos interagir com nossa tecnologia.
Outro aspecto da interação é a aproximação do computador com nosso corpo e com nossos sentidos. À medida que o tempo passa, passamos mais e mais tempo interagindo com o mundo virtual, e os novos dispositivos facilitam e incentivam essa interação: o laptop colocou a Internet em nossa mochila, o smartphone colocou a Internet em nosso bolso; o smartwatch coloca a Internet em nosso pulso, e por aí vai.
Mas talvez o exemplo atual mais contundente de interação sejam os dispositivos de realidade virtual: ali a interação é uma imersão na Internet, uma substituição pela realidade à nossa volta por um campo visual totalmente imaginado, com o qual já podemos começar a interagir.
E se a realidade virtual ainda tem muito a caminhar, outras variações sobre este tema já nos permitem interações ainda mais próximas com a Internet. A realidade aumentada — complementação do que vemos à nossa volta com elementos virtuais — aumenta sobremaneira nossa capacidade de interação com o mundo virtual, trazendo elementos deste para nossa vida real. O vídeo da Aeroglass, mostrando óculos em que a realidade aumentada auxiliam o piloto em um voo curto de avião monomotor fala por si só:
[arve url=”https://www.youtube.com/watch?v=E0UZWn4bnGY&t=29s” align=”center”/]
Mais uma vez: em que pese já conseguirmos interagir de forma contundente com o mundo virtual, as possibilidades estão apenas nascendo.
Rastrear
Estamos vivendo em uma era em que é possível coletar dados de praticamente tudo o que nos cerca, seja em nós mesmos ou nos elementos à nossa volta. De forma mais abrangente (e preocupante), acompanhamos a evolução do aquecimento global, do desmatamento, dos efeitos da poluição, e por aí vai. Acompanhamos movimentos celestes, crescimento e migrações populacionais e um sem-número de informações globais, mas também podemos acompanhar elementos mais prosaicos, mais mundanos. A Netflix, por exemplo, rastreia com precisão os hábitos de consumo de filmes e séries de seus clientes, e como resultado produz novas séries que invariavelmente são um sucesso, pois refletem as tendências destes clientes. A série Stranger Things, já tratada aqui nas páginas do Confrariando, é um exemplo claro disso.
Recentemente começamos a rastrear elementos de nossa fisiologia. Claro, a medicina já permite isso há muito tempo, mas apenas nos últimos anos começamos a fazer isso de maneira mais casual. Os fitbands e smartwatches permitem a coleta de dados pessoais que ajudam a nos mantermos em forma: distância caminhada diariamente, tempo parado, batimentos cardíacos, e outros elementos de nosso comportamento e de nossa fisiologia são coletados e analisados.
A quantidade e a qualidade dos sensores só faz crescer, e seu preço só faz cair. Ou seja: cada vez mais teremos facilidade de rastrear informações globais e pessoais, e sua análise tende a permitir uma melhoria em nossos processos e comportamentos.
Obviamente que há a questão da privacidade a ser equacionada nessa brincadeira toda, pois não é de interesse de ninguém, por exemplo, que suas questões de saúde sejam analisadas individualmente ou tornadas públicas. Além disso, movimentos escusos de rastreamento — tais como os esforços do governo norte-americano de acessar as comunicações e rastros digitais de seus cidadãos, como denunciado em 2013 por Edward Snowden — devem ser evitados, obviamente. Mas o fato é que cada vez mais coletamos dados, e cada vez mais temos dados a nosso respeito coletados por terceiros, e isso é uma boa notícia. Por um lado, o volume de dados sendo coletados (de um grande volume de pessoas) tende a trazer-nos o anonimato das multidões. Por outro, esses es dados auxiliam a criarmos soluções para problemas ou, no mínimo, a evidenciarmos os problemas (vide, mais uma vez, o aquecimento global).
Questionar
A era da Internet tem produzido uma longa série de “impossíveis”:
- Antes da internet, ninguém criaria uma enciclopédia de graç No entanto, aí está a Wikipedia;
- Ninguém criaria software de graç No entanto, aí está a comunidade Linux e inúmeros outros projetos de mesma natureza;
- Ninguém criaria vídeos de graç No entanto o sucesso do YouTube é inquestionável.
A Internet é prolífica em produzir o que antes seria inimaginável. Inúmeras são as soluções criadas sobre o alicerce da Internet, inúmeras são as facilidades, os serviços os produtos que vieram em sua esteira.
Ainda assim, o que temos de mais valor surgindo desta cornucópia digital não são as respostas, mas sim as perguntas. Perguntas do tipo: “E se qualquer veículo pudesse ser um táxi xi?” e “E se qualquer quarto pudesse ser um quarto de hotel” têm na Internet o insumo necessário para suas respostas, e essas as respostas provocam transformações profundas em como interagimos com o mundo. O Uber e o AirBnB, aqui já mencionados, surgiram dessasas perguntas.
Talvez seja esta a maior contribuição da tecnologia digital para a Humanidade: ela nos permite questionar para além do que antes era imaginavelmente possível. As possibilidades são vastas.
Isso me lembra um trecho de outro livro genial: O Cisne Negro, de Nassim Nicolas Taleb. Nesse e livro, em que o autor discute o papel daqueles eventos altamente improváveis, mas que quando acontecem, mudam tudo à sua volta, há uma discussão interessante sobre o que não sabemos. Taleb nos fala da “antibiblioteca” de Umberto Eco. O autor e acadêmico italiano era dono de uma biblioteca dom mais de 30.000 volumes no final de sua vida, mas ele era entusiasmado mesmo com sua “antibiblioteca”. Se a biblioteca era formada por milhares de volumes já lidos por Eco, a “antibiblioteca” era formada por igual volume de livros que ele adquiria periodicamente, mas que ainda não conhecia. A “antibiblioteca” é o mundo das possibilidades, e muitos foram os momentos em que ele descobriu coisas novas e fundamentais para seus estudos e obras literárias em suas páginas obscuras. Uma vez lido, o livro saia da “antibiblioteca” e ia para a biblioteca (ou para a pilha de descarte, se não estiver à altura das exigências do intelectual). Mas a ideia revolucionária vai sair sempre da “antibiblioteca”. É do que não conhecemos que vem o progresso.
É questionando o desconhecido que construiremos o futuro.
Começar
Kelly afirma que milhares de anos no futuro, quando forem estudar o início deste nosso terceiro milênio, os acadêmicos de então encontrarão um momento singular na história da Humanidade: terá sido o momento em que começamos a nos conectar globalmente nessa “coisa” a que chamamos Internet, mas que invariavelmente está começando a evoluir e sabe-se lá onde vai parar. Em outras palavras, estamos nos primeiros segundos de um jogo que tende a modificar profundamente nossa Civilização.
Em um artigo acerca do aniversário de 25 anos da Web, concordei com Kelly (mesmo antes de ter-lhe lido o livro): no futuro olharemos para o dia 23 de agosto de 1991 com a mesma admiração com que hoje guardamos o 14 de julho de 1789: uma nova era histórica, com novas relações sociais e econômicas nasceu ali.
Nesse sentido, somos tão incapazes de perceber a mudança quanto os Europeus o eram durante as Guerras Napoleônicas que se seguiram à Queda da Bastilha e ao Terror. Mas nem por isso as coisas eram (ou, em nosso caso, são) as mesmas.
Em um futuro não muito distantes perceberemos que estamos começando, e que este começo tende a se renovar por muito tempo ainda, uma vez que as novas tecnologias transformativas estão apenas no princípio de seu surgimento. Os cidadãos do futuro olharão para trás, para nossa época — e estando nós imersos nos enormes problemas que vemos à nossa volta é óbvio que tenhamos dificuldade de enxergar isso —, e terão vontade de ter presenciado nossa época. Pensarão com reverência no início, no pontapé inicial do futuro.
Sim, por mais que não nos pareça, por mais que tenhamos dificuldade em enxergar o que vem depois, estamos apenas no começo.
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The Inevitable é um livro importante, que vale a pena ser lido, anotado e guardado. Estou certo de que se trata de um mapa, de que olharemos para trás em 30 anos e enxergaremos em suas ideias e diremos algo na linha de “mas era tão óbvio que fosse ser assim! Como é que pode, apenas um indivíduo em mais de sete bilhões ter sido capaz de enxergar com tanta clareza o que deveria saltar aos olhos?”. Esta é a genialidade de Kevin Kelly. E é uma genialidade que pode ser muita coisa, mas óbvia não é.
Pingback:O Inevitável, parte 1 | Confrariando
[…] A segunda (e última) parte dessa resenha você encontra aqui. […]
Nossa! Que puta post! Li e pensei que era um post sensacional escrito por alguém que não o Ruy. Fui ver o autor e era vc! kkkkkkkk Eu fico pensando sobre as forças não tecnológicas. Amor, compaixão, empatia, por exemplo. Sobre as competências socioemocionais que poderiam até estar nas IAs e, talvez, fazê-las preservar a raça humana, por compaixão.