Manhã cinzenta e delicada de um dia qualquer de primavera. Frio diferenciado para dias que entrarão novembro a dentro. Cada mordida na maçã, suculenta e azeda por diversão, um pensamento surge e desaparece na mesma velocidade em que veio. O encerramento de um ciclo parecia motivo para festejar, mas estava mesmo era repleto de acontecimentos intensos, aos montes, insanos, todos embaralhados, que davam mesmo era um cansaço melancólico daqueles de fazer recolher todos os dentes do sorriso quase contente.
Ser humano é ser bicho estranho, talvez por isso leve mesmo uma vida inteira e além para evoluir. Foi preciso saborear alguns recados de otimismo para compreender, assim por alívio imediato, a grandiosidade de saber que tudo é bom. Existe o hábito, péssimo por sinal, de classificarmos tudo como bom ou ruim. O fato do julgamento ser inerente a todos nós vem muito daí. Pode parecer complexo, eu sei, mas é bem simples. É como se alguém estivesse na sala, assistindo a um filme qualquer: você entra, senta no sofá e assiste apenas dois minutos de uma cena. Apenas com essas informações, você classifica o filme como ruim, já que havia um homem chorando com a chuva caindo ao fundo. Percebe? O que realmente significava aquele choro, aquela cena, dentro do contexto geral do filme? Você deve estar dizendo que é óbvio que não dá para saber. E esse é o grande segredo, também óbvio, da vida. Não tem cena boa ou ruim, não tem acontecimento bom ou ruim. Tudo faz parte de um contexto maior, mais amplo e com ramificações muito além do que compreendemos. Claro que, no caso dos filmes, existem estilos para todos os gostos, não falo sobre isso. A grande questão talvez seja pensar em que ênfase de estilo você deseja dar ao roteiro de sua própria vida. Então, me pergunto, o que faz com que foquemos, de forma consciente ou inconsciente, em cenas apenas, sem levar em consideração o contexto maior da vida? O quanto de energia desperdiçamos criando cenas melodramáticas, problemas, desespero, suspense desnecessário, pensando ser esse o foco do roteiro original? E por qual motivo?
Talvez essas respostas residam na ideia de pensarmos que podemos rotular nossos roteiros como gêneros de filmes: romance, comédia, drama, terror, ação etc. A ansiedade inútil nessa escolha é tanta que mal nos damos conta de que a vida acaba sendo uma mistura de tudo, e que o desenrolar das cenas depende, única e exclusivamente de nós. Escolhemos a cada minuto qual será a cena seguinte e como daremos sequência a cena passada. Acontece que o roteiro só fica intenso mesmo, e original, se formos o ator principal de nossas vidas e tivermos consciência de que o “agora” será sempre a cena mais importante. Temos o poder, intransferível, de transformar o terror em comédia; o drama em romance; o suspense em ação. Se você não sente esse poder, observe se está mesmo como ator principal ou se escolheu ser mero coadjuvante ou apenas figurante. Você escreve o roteiro, atua, dirige, assiste e vive tudo isso.
A partir desse viés, fica meu questionamento: o que nos impede de atuarmos como realmente somos e não como personagens seguindo roteiros adulterados? Qual o motivo de ainda atuarmos a partir de algo e para agradar ao outro e não a nós mesmos?
Quem de nós está realmente disposto a seguir seu roteiro original, custe o custar, mesmo que seja para nadar contra a correnteza? Quem de nós se sente forte o suficiente para agir dessa forma?
Talvez você pense que tudo isso é uma grande besteira e você faz sempre exatamente o que quer de sua vida. Será? Você se conhece? Sabe do que gosta? Você faz o que ama? Ama o que faz? Vive o hoje, em sua forma mais doce e plena? Cada passo é realmente coerente com o que você pensa, sente e age? E tudo isso cem por cento do tempo?
Se você disse sim para todas as perguntas, talvez seja um Buda e ainda não tenha se dado conta. Parabéns.
Se você acha que em algum momento já se sentiu perdido, ou vez ou outra se perde e se encontra, você é humano como eu.
O que quero dizer é que é normal se perder, mudar de ideia, querer outras coisas, buscar incansavelmente o que pede o coração. E, na minha opinião, essa busca não é para ter fim. Buscar constantemente é o que move, fascina e transborda de amor a vida. Quanto menos respostas, mais perguntas e mais perto de mim mesma estou. E isso é completamente apaziguador para minha alma.
Buscadores se preparam, ou estão preparados, para atuarem como são em essência. Penso que todos têm o mesmo potencial para serem o que são e viverem do que sonham. O que diferencia quem faz isso de quem não faz, tem princípio em uma única palavra: coragem.
Cada dia é uma nova chance. Cada chance, uma bênção bonita. Louca eu seria se não soubesse disso. Num estalo tudo se acaba, se esvai, se transforma. Vale mesmo a pena viver todos os dias por algo em que não se acredita? Esperar o que e para que?
Eu quero ser feliz agora. Que é muita emoção para uma só pessoa, muito amor numa só alma, muitas palavras para poucos dedos, muita missão para tanta pessoa. Busquemos boas novas, meus caros.
É isso e é só.
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