Tantas outras coisas podem ter reprise. Isso acaba sendo até mesmo a maneira como nos apresentamos ao outro, como uma ponte, um acesso por meio de algo em comum. Principalmente na falta de assunto. Primeiro encontro de um casal: se é um bom encontro, sempre será marcado por essas coincidências nas reprises que, nesse caso, viram pretexto para outra reprise (Um segundo encontro, talvez?).
Esse gosto pela reprise também é difícil, se contamos para alguém que não dá o devido peso à mesma experiência. Aí, é como um pai que dá seu brinquedo favorito de infância, guardado a sete chaves, para o filho futuro. Quando este o vê, pega e o deixa de lado nos primeiros instantes, sem um lampejo de interesse, o ingrato. No fim, nós, os amantes da reprise, achamos todos loucos ou ingratos os que não valorizam a obsessão do momento. Também há aqueles que acham essa coisa de ver de novo, várias vezes, algo estranho, uma loucura ou pura perda de tempo. Afinal, não é possível gostar de algo tanto assim. Será?
Censuram-me com frequência por falar empolgado das coisas que me fascinam. Mas ultimamente tenho ficado mais calado sobre essas reprises, as quais comento somente com quem me tolera ou curte essa pegada. Assim, não amolo mais ninguém. Mas, com isso, perde-se também a oportunidade de se ouvir mais, quando a pessoa fala de suas próprias reprises. No fundo, compartilhamos um pouco de nossas obsessões, de nossas almas.
Agora, quando conheço alguém e gosto, também quero repetir a dose. Aí, falo das minhas reprises. Quero mesmo é aproveitar o tempo. Estender esse encontro, ao máximo. Com isso, me redescubro um pouco também no outro, na leitura inusitada das reprises, e das não reprises. No fim, se isso dá certo, quero um repeteco. Afinal, o segredo de uma boa conversa é ser generoso.
No entanto, fazer uma pessoa virar reprise é algo que vai ficando raro hoje em dia. Nem sempre dá certo, porque ninguém vê e sente o mesmo que você. Dizem que isso se deve à falta de tempo, ou ainda às redes sociais. Ou ambas, que seriam responsáveis pelo individualismo exacerbado e por uma autopromoção ferrenha. também já ouvi dizer que ter tempo para alguém é artigo cada vez mais raro. Como acho que a mesquinhez e a ingratidão sempre grassou por aí, essas afirmações nada me surpreendem.
Recentemente, conheci uma pessoa que me surpreendeu dizendo-se empolgada sobre muitas coisas, em essência sobre uma viagem sua a um evento político em Brasília. Puro deslumbramento. Diante disso, minhas reprises talvez não fossem tão interessantes como os discursos vazios, os acordos e reuniões à surdina, o aperto de mão de adversários históricos, o lobby (esse novo nome para o conchavo). Naquele momento, tentei, mas não deu liga, nem reprise. Fiquei triste. No entanto, há de se ter ainda esperança no coração, sabe?
Lembro-me de meu primo, o Zé Carlos. Quando a gente era moleque, na época em que ele e meus outros primos moravam no distrito de Estreito, ele não aguentava minhas sessões de leituras torturantes, meus comentários sobre livros de que ele não gostava nem um pouco. Foi junto dele, do André e do João Roberto, na sala de cinema daquele lugar onde tive minha primeira experiência de cinema. Superman II. A cena de Christopher Reeve salvando o mundo saltava da tela e entrava no mundo dos sonhos.
Obrigado, Zeca, pela paciência e pelo ouvido amigo. Até hoje, tratamo-nos com aquela ternura que somente os meninos de boa infância têm (“- Ô, seu caprino!”; “- Fala, cabeçudo!”). Agora moramos um pouco longe.
Chega a notícia de que o Zeca quer rever a mim e à família, agora um pouco maior. Meu filho adora aquele carrinho velho e gasto, ao invés dos outros, novos.
Reencontros são boas reprises.
Caro Guilherme, Belas lembranças de nossa infância. Obrigado por fazer parte de nossas vidas. Abraço!!!
Caro JR, eu é que agradeço. O texto é só uma tentativa - imperfeita, é certo - de capturar aquele momento. Abraço fraterno para todos! Repasse para a turma!
E o que é a amizade senão um eterno reprise aprendiz sobre essa terra gasta? Abraço, mano velho!