Entre gargalhadas e assombro, fui percorrendo os conselhos que eram publicados nas revistas femininas dos anos 1950 e 1960 e voltados às jovens daquela época. Alguns deles estão reproduzidos Na Folha Online de 11 out. 2017. Não há como ler e não pensar em uma diversidade de comentários a cada um deles.
– Não se deve irritar o homem com ciúmes e dúvidas. (Jornal das Moças, 1957)
Fiquei pensando: e se o homem se irritasse sozinho? E se ele fosse ciumento e se irritasse facilmente? Ah, claro! Agora entendi: a culpa seria sempre da mulher.
– Se desconfiar da infidelidade do marido, a esposa deve redobrar seu carinho e provas de afeto. (Revista Claudia, 1962)
Nuossa! Como é mesmo? Ah, sim! Entendi: era uma época em que o casamento era o emprego para a mulher. Assim como hoje, quando percebemos o risco de demissão, redobramos nossa carga de trabalho e dedicação.
– A desordem em um banheiro desperta no marido a vontade de ir tomar banho fora de casa. (Jornal das Moças, 1945)
Em outras palavras: quando o marido sair do banho e deixar o banheiro em desordem, a mulher deve arrumá-lo imediatamente!
– A mulher deve fazer o marido descansar nas horas vagas, nada de incomodá-lo com serviços domésticos. (Jornal das Moças, 1959)
Até que faz sentido… Se o homem era o cavalo que carregava o peso da subsistência para dentro de casa, não faria sentido desgastá-lo para carregar um balde de água da lavanderia para a cozinha, não é mesmo?
– Se o seu marido fuma, não arrume briga pelo simples fato de cair cinzas no tapete. Tenha cinzeiros espalhados por toda casa. (Jornal das Moças, 1957)
Sabe o que essa recomendação me fez lembrar? A recomendação que nos dão quanto aos nossos pets: “se o seu gato faz xixi pela casa, não brigue com ele. Espalhe caixinhas de areia por todos os cantos”.
– A mulher deve estar ciente de que dificilmente um homem pode perdoar uma mulher por não ter resistido às experiências pré-nupciais, mostrando que era perfeita e única, exatamente como ele a idealizara. (Revista Claudia, 1962)
Um dos traços da transação comercial caracterizada pelo casamento (principalmente naquela época): a garantia do produto lacrado.
– Mesmo que um homem consiga divertir-se com sua namorada ou noiva, na verdade ele não irá gostar de ver que ela cedeu. (Revista Querida,1954)
Parece-me que os homens se divertiam tentando se divertir com as mulheres. E, se conseguissem se divertir, deixava de ficar divertido. Puxa, que complicado!
– O noivado longo é um perigo. (Revista Querida, 1953)
Hoje, continua sendo perigoso: conhecer demais o outro pode nos levar a não querer muita convivência…
– É fundamental manter sempre a aparência impecável diante do marido. (Jornal da Moças, 1957)
Olha, na verdade, acho que isso deveria valer até hoje, em reciprocidade. Ninguém merece ver o amor de sua vida com moleton e crocks.
Por mais que os movimentos feministas já tenham conquistado muitos direitos às mulheres, sei que ainda temos, na cultura brasileira, fortíssimas reminiscências do machismo e do patriarcalismo. Então, fiquei curiosa para saber como seriam as reações dos brasileiros – conforme idade, gênero, regionalidade e classe social – aos conselhos no Jornal das Moças; coluna publicada na Revista Cláudia e na Revista Querida dos anos 1940, 1950 e 1960.
Qual é a sua reação ao ler as recomendações apresentadas? Que tal escrever ao Confrariando e registrar seu comentário?
Eu acho que não se pode deixar de levar em conta o contexto cultural da época. Não estou dizendo que fosse certo, mas não dá para voltar no tempo e falar para o Pizarro que os Incas tinham direitos humanos, que ele devia respeitar a cultura deles...Imaginou a cara do Pizarro? Sempre o foco foi no conquistar e essa é a vitória. Os bravos defensores? Só são chamados de bravos porque a derrota soou como vitória da coragem, não? Uma mulher conquistar um homem? Kd a vitória? Quem é a mulher para tirar do homem essa sensação? Fico pensando na mulher querendo divertir-se também, mas contendo-se, submetida ao conceito dúbio de divertimento do homem. O conquistador.
A cultura: a mãe do atar e do desatar... Ela deve sim sempre ser vista porque está sempre nos vendo. Os jogos entre sexos são antiquíssimos e, não por isso, deixam de ser questionáveis. Até que ponto é saudável nos divertirmos em função do outro...? Pois é, caríssimo Jaylei: as reflexões devem ser feitas com coragem e discernimento.