Havia toda uma tensão oculta vinda, em absoluto, dos beijos que não aconteceriam. Era tarde, na noite e na vida. A escolha antecipada do que não se sabe, acaba por inundar o ser de outras tantas intempéries que nem na pior das tempestades mar adentro, pode se ver. A retidão é coisa para os fortes.
O quadro pendurado na parede interfere na concentração que ela tem, mas que deseja não ter. Ao se conhecer é possível também desviar do que não se quer, mas se pode desejar. Doar é uma escolha e não acolher também pode ser. As palavras, tolas mensageiras de sei lá sabe o que, talvez nem tivessem tido o trabalho de acontecer se pudessem imaginar que virariam pó ao invés de realidade. Muitas vezes, quase todos os dias, cenas acontecem e nos arrastam em desespero. Como enxurradas enlouquecidas, tentam a todo custo nos afastar de nosso bom senso recriado pelo coração, num despropósito instigante de tentativas severas de sedução do que não se vê.
É o poder pessoal, e, provavelmente, apenas ele, quem veste capa de super heroi e transforma a enxurrada em arco-íris. Sim, para qualquer cena, a qualquer momento, em qualquer lugar. Isso exige treino, alguma concentração de ser e toda vontade que pulsa no próprio bem querer, aquele mais insano e denso. Pode parecer ilógica essa explicação, que vai de um extremo de cena de filme de terror à visão mais equilibrada de escolha colorida do que se vê por sentir. Não há que se entender, é não lógico mesmo. Irritantemente intensa, essa sensação de poder de si mesmo atormenta, de forma bem cruel, nossos amigos de longa data: os medos presos em nós.
Há que se ter uma coragem um tanto quanto inusitada para abrir a gaiola. E outro tanto de insanidade autêntica para pular e voar. O que aprisiona você, afinal? Quais são seus medos mais cinzentos e cínicos, guardiões dessa prisão tão requintada? São esses mesmos medos que insistem em colocar uma fantasia de carnaval, das mais belas, e fazer com você desfile na apoteose da zona de conforto como se não houvesse amanhã. Por que, afinal, você os mantém sob o seu comando?
A pergunta que não quer calar é: quem impede você de viver a realidade que tanto sonha? Veja, se apenas uma pessoa tem todo o poder positivo sobre você mesmo, faz sentido que essa mesma pessoa tenha também todo o poder inverso e consiga manipular sua particularidade mais antiga de pavor, assim bem disfarçado, até conseguir paralisar você, com o objetivo de assistir sua mumificação perante a glória que é a vida? Quem teria tanto poder assim sobre você, mergulhado em tamanha dualidade e genialidade? E, cuidado, a resposta pode causar danos irreversíveis às mentes mais desavisadas de autorresponsabilidade. Isso porque o único ser capaz disso tudo é você mesmo, meu caro, é óbvio.
Se você se prende na gaiola e deixa seus medos serem os guardiões dessa realidade medíocre que você diz acreditar ser a melhor, também é você, e só você, quem pode virar o jogo e começar um novo capítulo, uma nova vida, uma nova era em si mesmo.
Muitos acharão a ideia tão louca quanto saltar e voar. Mais louco é não viver, se coroar, assim por diversão, como o mais justo dos homens e querer ser adulado como a grande vítima das circunstâncias para que ninguém perceba o jogo por trás de tudo, que é o fato de você se deixar manipular por seus próprios medos e se entregar à mediocridade a que se resume isso.
Após a guerra santa entre sua Luz e sua sombra, eis que um novo céu azul poderá ser visto. Novo apenas porque você nunca havia olhado para cima. Assim como o céu, seu poder sempre esteve ali e sempre estará. Olhar para cima faz toda diferença. O ar fica mais puro, tudo ganha novo colorido, os ruídos são automaticamente substituídos por cantos ternos e doces.
O sorriso ganha a extensão toda da alma. O espírito se torna encantamento puro de ser, a mágica da vida acontece e segue por si mesma. A serenidade agora reina. Todos os sentidos estão abertos, atentos e vigilantes. Ao invés de medos, agora o preenchimento do que se é toma forma de amor diário, zeloso e caridoso por essência.
Nem futuro, nem passado. O presente só existe em si mesmo enquanto houver aceitação do divino e talvez seja, por si só, a única amorosidade de entrega real em existir plenamente. Voar é preciso, necessário e acolhedor. A preocupação com o rumo não existe quando se é bússola de si mesmo.
O presente é libertador e delicioso, sempre será. Que assim seja!
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