Hoje, um amigo do trabalho nos brindou com o envio de um belíssimo poema de Ferreira Gular: O açúcar. Ao ler, em meio aos afazeres do trabalho, no corre-corre de cumprimentos de prazos e compromissos, aquelas palavras me afetaram substancialmente.
O branco açúcar que adoçará meu café
nesta manhã de Ipanema
não foi produzido por mim
nem surgiu dentro do açucareiro por milagre.Vejo-o puro
e afável ao paladar
como beijo de moça, água
na pele, flor
que se dissolve na boca. Mas este açúcar
não foi feito por mim.Este açúcar veio
da mercearia da esquina e tampouco o fez o Oliveira, dono da mercearia.
Este açúcar veio
de uma usina de açúcar em Pernambuco
ou no Estado do Rio
e tampouco o fez o dono da usina.Este açúcar era cana
e veio dos canaviais extensos
que não nascem por acaso
no regaço do vale.Em lugares distantes, onde não há hospital
nem escola,
homens que não sabem ler e morrem de fome
aos 27 anos
plantaram e colheram a cana
que viraria açúcar.Em usinas escuras,
homens de vida amarga
e dura
produziram este açúcar
branco e puro
com que adoço meu café esta manhã em Ipanema.Ferreira Gular. O açúcar
Toda poesia, Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1980.
Fiquei pensando na lógica de produção que nós desenvolvemos em nossa civilização. Eu me vi consumidora do açúcar doce que veio de usinas amargas, consumidora de roupas confortáveis que vieram de fábricas sub-humanas, consumidora da carne que veio de abatedouros cruéis, consumidora de móveis art nouveau cuja madeira veio de florestas silenciadas.
Mal-estar. Consciência. Dor. Letargia. Afinal, como se destrava um sistema hermeticamente sorumbático?
Oi querida. Eu sugiro ler, "O Mundo Mais Bonito Que Nossos Corações Sabem Ser Possível", do Charles Eisenstein. O mundo está em transformação, se vamos sair dessa a tempo, não sei. Um dos cenários que o Stephen Hawking fala é de que em 600 anos estaremos extintos se não procurarmos outro planeta. Será? O sistema monetário é ruim, o capitalismo deixa sequelas severas e isso não é dizer que o comunismo é melhor. Sim, o capitalismo selvagem tem problemas bem claros. Se todos países consumissem/produzissem como o EUA precisariámos de 5 a 6 Terras. Não é falácia, é real. Agora, como escrevi no início, é possível sonhar, é possível criar outros cenários, amenizar a destruição causada pela presença humana na Terra. Depende de ações diárias, depende de conexão, de que o conhecimento chegue aos ignorantes e torne-os ativistas, pensadores, empreendedores sociais. Existe um lema: pensar global, agir local. Talvez a saída.
Alôu, meu Caríssimo!!! Agradeço imensamente sua recomendação. Como é importante nos reanimarmos uns aos outros nessa trajetória humana tão cheia de percalços... Quando entramos em um túnel e a luz nos falta, é muito bom encontrar alguém que nos traz uma lanterna! Fique bem, hoje e sempre!