Lá estava eu, pesquisando sobre Neuromarketing, pois tem sido um dos temas que me despertam grande interesse (dentre outros zilhões de assuntos, na verdade). Se você leu meu texto Nos Bastidores do Consumo, deve saber disso.
Não é de hoje que o Marketing (em letra maiúscula para designar um saber da área de Ciências Sociais Aplicadas) tenta infiltrar-se no interior dos consumidores, para que, ao descobrir seus segredos mais íntimos, possa envolvê-lo em programas de consumo pré-estabelecidos pelas grandes indústrias. Nessa toada obstinada e inteligentemente calculada, os estrategistas selecionam ferramentas que vão desde o simples boca-a-boca até os estudos recentíssimos da Neurociência.
Não é mistério para ninguém que as descobertas científicas se tornam instrumentos da humanidade. Só que, instrumentos para quê? Eis a questão: para o que nossos cérebros desgovernados bem quiserem. Que tal alguns exemplos? A descoberta da fissão nuclear tornou possível a solução para prover a humanidade de recursos energéticos, assim como também o extermínio de milhões de inocentes. A compreensão do papel de neurotransmissores tornou possível a produção de medicamentos que reduzem os efeitos negativos de doenças mentais, assim como também a produção de drogas que dão “barato” (por exemplo, o ecstasy).
Os estudos da Neurociência tornaram possível compreender melhor o comportamento humano, assim como também dá subsídios para que o Marketing possa conquistar mais clientes e mantê-los hipnotizados. Ops! Eu quis dizer: mantê-los fiéis à marca.
Não, eu não estou traindo as origens de minha formação profissional. Talvez, até por ser graduada e pós-graduada em Marketing, eu me sinta suficientemente à vontade e segura para propor discussões mais delicadas. A reflexão que eu proponho, neste texto, nasce da minha própria experiência como consumidora e como consultora de Marketing. Essa dualidade me permite praticar um consumo consciente – uma vez que eu sei, muito bem, o que se passa nos bastidores mercantis – e me permite tentar ser (nem que minimamente) responsável nas estratégias que eu recomendo. Dessa forma, espero poder contribuir com um pouco de lucidez sobre a análise do insólito “jogo do mercado”. Seja você um jogador (estrategista) ou um peão (um consumidor), creio que vale a pena embarcar comigo em mais essa viagem.
Nosso ponto de partida é o Neuromarketing. Caso você ainda não tenha lido meu referido texto, retomo o conceito: trata-se da apropriação dos conhecimentos da Neurociência para compreender e conhecer o funcionamento do cérebro do consumidor. A partir daí, podemos prosseguir com o raciocínio: a Neurociência conhece muito mais o cérebro humano do que o próprio indivíduo, portador desse cérebro! Quando o Marketing evolui para Neuromarketing, ele pode ter mais controle sobre o cérebro do consumidor do que o próprio dono desse cérebro!
Essa colocação pode parecer um exagero, mas tem a chancela de Martin Lindstrom – escritor dinamarquês, autor de muitos best-sellers de Marketing que, em entrevista recente, disse:
Sabemos que 85% das decisões que tomamos, como escolher a marca do xampu, são feitas no subconsciente. Por isso, alguns estímulos podem ser decisivos na hora da compra. Isso pode ser usado para o bem ou para o mal.
É provável que o Marketing ainda esteja apenas “tateando” as possibilidades de domínio sobre a mente do consumidor por meio da Neurociência. De qualquer forma, creio que seja prudente ficarmos atentos, pois muitos executivos já utilizam termos como dopamina, norepinefrina e ocitocina (neurotransmissores) como jargões em seus planos estratégicos.
Em artigo veiculado no UOL, o psicólogo português e especialista em comportamento do consumidor, Fernando Rodrigues declara que conquistar um consumidor é como conquistar uma mulher. Algumas de suas declarações teriam sido:
A primeira coisa que o homem precisa fazer quando quer conquistar uma mulher é atrair a atenção dela. Para isso, é preciso aumentar as taxas de dopamina e norepinefrina, neurotransmissores que geram sensação de bem e euforia. Piadas, por exemplo, têm esse efeito na hora de conquistar uma mulher. Mesmo não querendo ser conquistada, a mulher se sente atraída. O mesmo vale para o consumidor. Para atraí-lo, a marca precisa chamar sua atenção de alguma maneira marcante, o que pode ser feito por meio de uma propaganda, por exemplo.
Atualmente, há tecnologias de ponta que podem demonstrar se a audiência está sendo impactada da forma correta por determinada marca. Em e-book intitulado de Neuromarketing – elaborado pela parceria entre Fernando Kimura (Palestrante de Inovação e Neuromarketing), Forebrain (empresa de soluções em neurociência do consumo) e Soap (criadora de e-books) – são mencionadas as seguintes ferramentas:
- Eletroencefalografia (EEG): Mede o padrão de ondas cerebrais do consumidor, com equipamentos de alta precisão utilizados em pesquisas biomédicas.
- Eletrocardiografia (ECG): Avalia a variação da frequência cardíaca do consumidor, ou seja, detecta alterações na velocidade em que o coração está trabalhando.
- Eletromiografia facial (EMGF): Capta a atividade de músculos da face do consumidor, responsáveis por expressões positivas e negativas.
- Pupilometria: Analisa a variação do diâmetro da pupila do consumidor.
- Salivação: Mede a variação do volume de salivação do consumidor.
Se isso tudo lhe parece uma “parafernalha” pronta para te subjulgar, ainda não viu nada! Um artigo da Revista Exame publicado em 2013 mencionava um grupo de pesquisadores da Universidade de Lancaster, na Inglaterra, que se dedicava ao desenvolvimento de uma tecnologia que deveria permitir que usuários controlassem a tela de seus televisores com o olhar e, assim, anunciantes conseguiriam direcionar os anúncios de acordo com a visão do telespectador. (Hipnose à distância?)
Alguns “truques”, praticados pelo comércio, já são bem conhecidos: o jeito como o preço de um produto é informado, a cor usada na parede da loja e até a música do ambiente tentam nos influenciar na decisão de compra. Alguns exemplos são ilustrados na página do Economia.Uol:
- Segundo pesquisas alemãs, perfumar o ambiente aumenta em até 15% a probabilidade de uma venda.
- O formato curto do preço faz parecer que o valor é menor. Se as letras forem pequenas, o preço parecerá ainda menor.
- Escadas rolantes são posicionadas de forma que o cliente precise andar pela loja inteira para encontrá-las. Assim, passando por diversos setores da loja, ficará mais tentado a comprar.
- A cor vermelha, por exemplo, estimula o apetite. Nas lanchonetes de fast food, essa cor está com logotipos, mobiliários e embalagens. O consumidor fica com mais fome e come mais rápido, dando espaço para outros clientes.
- Em cardápios de restaurantes, os primeiros pratos são os que têm preços mais altos, depois, vêm os médios e, só então, os mais baixos. Vendo o preço mais caro primeiro, o consumidor terá a ilusão de que o restante vale a pena.
Poderíamos ficar aqui, só listando as mais incríveis peripécias do Neuromarketing para nos seduzir às compras desenfreadas. Nesse tabuleiro do consumo, o Marketing é o jogador, e o consumidor é o peão.
E então? Qual é sua sensação depois dessa viagem? Quanto a mim, como consumidora, fico assustadíssima; como consultora de Marketing, fico fascinada. Seja como for, se eu pudesse fazer algum tipo de recomendação, eu diria: tenhamos tanto mais lucidez como consumidores, assim como mais ética como praticantes do Neuromarketing.
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[…] não vivencia a comunicação. Não é para menos que, de uns tempos para cá, os estudos sobre o neuromarketing têm se intensificado tanto: tudo pela atenção plena do […]
Tive a oportunidade de aprender um pouco sobre o assunto em um técnico de Computação Gráfica, é um assunto que deveria ser mais divulgado, aqui por exemplo aborda o assunto de forma que uma pessoa que nunca ouviu falar do tema aprenda e possa explorar mais sobre... Bacana o artigo ainda mais vindo de uma pessoa que tem princípios e uma bagagem extensa sobre.