Eu gosto do roteiro do amor. Eu gosto da surpresa do primeiro encontro, da percepção de beleza, do coração acelerado, da insegurança, do desvio de olhos com um sorriso tímido. Gosto da sedução, do indeciso destino querendo aproximar e repelir, da primeira conversa desajeitada, da troca de telefones. Gosto do nervosismo das conversas que começam confusas e depois tomam um rumo agradável, do acompanhar até em casa depois de um bom jantar, do primeiro beijo. Gosto do encontro de mãos e dedos, dos beijos calorosos, do encontro feroz de corpos, do enrolar a se despedir. Gosto das prudências iniciais, da resignação, do cuidado pra não se apaixonar tão rápido, do sumiço de um dos dois porque este tem medo do que isso tudo pode virar, da preocupação do outro em ter falado algo que não devia. Gosto do choro, do tomar umas a mais porque ele ou ela sumiu, da comoção em uma comédia-romântica boba, do dormir triste e acordar lendo uma mensagem que leva um dos dois às nuvens.
Gosto do reencontro e reconciliação, do primeiro eu te amo envergonhado, da incipiente intimidade. Gosto das primeiras permanências, do acordar ao lado que se torna mais frequente, da apresentação para as famílias e amigos, do partilhamento de segredos obscuros. Gosto da cogitação em morar juntos porque “fica mais barato e de todo jeito a gente já fica junto o tempo todo”, do atraso do fluxo dela e do primeiro exame negativo de gravidez que deixa o casal aliviado. Gosto quando um dos dois chega chorando porque perdeu o emprego, da necessidade de sacrifício do outro em uma jornada de trabalho maior para conseguir sustentar a casa, e do regozijo do desempregado por conseguir um novo trabalho. Gosto do susto da primeira gravidez e da indignação da mulher que diz ter tomado o anticoncepcional religiosamente, da reunião em família para se dar a notícia de que mais um membro está a caminho, do casamento discreto, e da lua de mel em um final de semana.
Gosto da adequação do jovem casal à nova situação, da mudança para uma nova casa, da dificuldade financeira inicial, da batalha por melhores condições, do cansaço e do questionamento sobre a viabilidade do amor. Gosto da criança correndo pela casa, da barriga saliente do pai de família, das brigas e da conclusão que, felizmente ou infelizmente, um não vive mais sem o outro. Gosto dos períodos mais quentes e frios da relação, do crescimento dos filhos, do não que o homem diz à sua nova secretária nova porque “sua mulher não é fitness, mas ainda sim é a mais linda do mundo e jamais conheceu outra que tem tanta garra na vida”. Gosto da sobriedade de um relacionamento consolidado, do choro da mãe quando o filho vai pra faculdade, do coração preocupado da mulher e da racionalidade do homem, do rapaz que visita os pais e traz consigo uma menina que chama de namorada, do ciúme da mãe e do orgulho do pai.
Gosto da emoção na formatura dos filhos, dos seus casamentos e das crianças correndo pela casa no feriado. Gosto do capricho do avô e da avó ao preparar a casa para a reunião de família no natal, das ruidosas conversas na sala, do sair do avô e netos em uma manhã de domingo, e dos conselhos que o filho maduro pede ao pai experiente quando a esposa não está por perto. Gosto da melancolia dos velhos quando todos vão embora, do olhar senil em um álbum de família, das cadeiras de balanço e das mãos enrugadas na varanda em um final de tarde. Gosto de pensar que essa história de amor estará sendo reescrita pelas mãos dos seus filhos. Gosto de pensar que as gerações futuras conservarão este roteiro sempiterno. Gosto de pensar no roteiro infinito do amor.
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