Pedro Calabrez (Pesquisador do Laboratório de Neurociências Clínicas da Escola Paulista de Medicina da UNIFESP), pelo NeuroVox no Youtube, fala um pouco sobre a questão do “controle x escolhas”.
Ele menciona a Filosofia Estoica, nas palavras de Epicteto:
“A principal tarefa na vida é simplesmente esta: identificar e separar questões de modo que eu possa dizer claramente para mim mesmo quais são externas, fora do meu controle, e quais têm a ver com as escolhas sobre as quais eu, de fato, tenho controle. Onde, então, devo buscar o bem e o mal? Não em externos incontroláveis, mas dentro de mim mesmo, nas escolhas que são minhas.”
Cada um de nós sente na pele a dificuldade de saber até onde pode ou não interferir no próprio cotidiano. Trata-se de uma questão diária que nos faz gastar bastante tempo e energia. Sofremos os sintomas quando nos deparamos com engarrafamentos a caminho do trabalho; com o aumento dos impostos, com o chuveiro queimado em plena manhã de inverno.
Quando esses problemas vêm à tona, já não temos mais o controle sobre sua origem. Somos obrigados a gerenciar as consequências. Só que fomos criados (ou melhor, adestrados) a nos martirizar com o sentimento de que fomos responsáveis e que poderíamos ter feito algo para evitar as implicações. Quem sabe não teríamos evitado o engarrafamento se tivéssemos escolhido outro caminho para irmos ao trabalho. Se fôssemos mais ativos como cidadãos, talvez os impostos não teriam aumentado tanto. E se gastássemos um pouco mais numa resistência blindada, o chuveiro teria aguentado durante todo o inverno. Chegamos a um ponto em que já não sabemos o que é pior: sofrer com as consequências ou sofrer com a culpa por não as evitarmos.
Diante desse descompasso, lançamos mão do subterfúgio de procurar culpados: a incompetência do poder público em não resolver os problemas de transporte; a corrupção desenfreada que nos leva a sustentar os políticos por meio dos impostos; a tirania da indústria de bens de consumo que não é capaz de produzir chuveiros vitalícios.
Nessa toada, há motivos de sobra para ficarmos estressados constantemente. Tudo parece estar fora do controle. E grande parte de nós acredita que a culpa é de agentes externos. Há outra parte que, acreditando ser sua própria responsabilidade, vive em constante autocondenação. E, por fim, talvez haja ainda mais um grupo que se ocupa de intensas elucubrações para desenvolver artifícios de controle da vida, como se isso fosse possível….
Pedro Calabrez nos recomenda a seguinte reflexão: “O que eu posso fazer de fato para mudar ou para interferir efetivamente no problema que eu vivo? Se a resposta for ‘nada’, devo aprender a me desapegar do problema e focar minha atenção naquilo que realmente sou capaz de mudar ou influenciar.”
Não sei quanto a você, mas me parece muito mais difícil ter discernimento para distinguir meus limites de ação do que para me desapegar do problema sobre o qual já descobri que não tenho controle. Até porque vivemos numa cultura da obrigação ao sucesso. Somos treinados para acreditar que somente aqueles que conseguem controlar o máximo de variáveis (internas e externas) são vencedores. Essa crença, aliás, tem sido o melhor apelo para a comercialização de cursos para “alta performance”. Neles, são ensinados métodos incríveis para diagnosticar problemas e antecipar-se a eles. Ah,que delícia!… Se fosse verdade.
Há uma linha tênue entre ter percebido que não temos controle sobre determinado problema e sermos julgados como acomodados e derrotistas. Por isso, alguns lutam até a morte quando se deparam com problemas sobre os quais não têm qualquer controle (não desistir jamais!). Afinal, como saber se não abrimos mão antes da hora? Como saber se não nos desapegamos sem tentar uma última interferência resoluta? Onde encontrar a resposta? Talvez, Epicteto nos respondesse: “Não em externos incontroláveis, mas dentro de mim mesmo, nas escolhas que são minhas”.
Parece tão simples… Eu não acho! E você? Consegue ter certeza se você realmente não tinha como interferir naquele problema do qual se desapegou?
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