Você já ouviu falar em Personal Branding? Do inglês, Gestão da Marca Pessoal, trata-se de um nome bonito para se falar de um tema ligado ao Marketing Pessoal. Se você tem reservas quanto a usar jargões estrangeiros, é importante aceitar que a maior parte dos termos do marketing mantém-se na língua inglesa, o que é compreensível, pois esse conhecimento tem berço nos Estados Unidos.
Um dos maiores especialistas em Estratégias de Marcas no Brasil é Arthur Bender, e tenho em mãos sua obra Personal Branding – construindo sua marca pessoal (Editora Integrare Business, 2009). A obra propõe fornecer caminhos para a administração e potencialização da imagem de uma marca pessoal.
Afinal, o que é uma marca pessoal? Seria algum produto que podemos criar, na garagem de nossas casas? Quem sabe, uma receita que você mesmo pode desenvolver na cozinha de seu apartamento? Não! Estamos falando de você como um produto a ser comercializado com sucesso no mercado. Ops! Isso está mais parecendo um processo de “coisificação do ser humano”. Bem, não deixa de ser…
O termo formal, usado para lançar discussões a respeito do que circunda a “coisificação”, é reificação. Você poderá encontrá-lo no marxismo, ao explicar como o capitalismo transforma as relações sociais em relações entre objetos de troca. A transformação do homem em mercadoria foi um tema bastante explorado pela Escola de Frankfurt (escola de teoria social interdisciplinar neomarxista, nascida em 1924).
Minha intenção, nesse texto, não é aprofundar-me nas ideias frankfurtianas ou nas ideias marxistas, até porque precisaríamos de dezenas de laudas para isso. O que eu proponho, como reflexão, é olharmos para a dualidade encontrada na disciplina do marketing pessoal: por um lado, constitui-se em importante ferramenta para a articulação consistente de um profissional no mercado de trabalho acirrado de nossa atualidade. Por outro lado, traz em seu bojo o risco de se transformar o homem em mera mercadoria.
O marketing pessoal consiste em utilizarmos a inteligência do marketing (é assim que nos referimos à toda construção dos preceitos desse conhecimento,) para alcançarmos o sucesso e a consistência como profissionais competitivos.
O livro de Bender promete oferecer respostas às perguntas: “Como avaliar a imagem percebida da minha marca pessoal? Como migrar da atual posição para uma melhor? Como dar os primeiros passos para construir uma nova posição? Como diferenciar minha marca pessoal e tornar-me único no segmento? Como trabalhar a visibilidade e criar mais valor para minha marca pessoal? Como estabelecer um posicionamento para minha marca? Que estratégias são possíveis? Que métodos e ferramentas táticas posso empregar? Que atitudes podem fazer toda a diferença para melhorar minha reputação? Como posso fazer um plano estratégico para minha marca pessoal?” (p.20)
Como qualquer ferramenta inventada pelo homem, o marketing pode ser utilizado com ou sem responsabilidade: depende apenas de quem o estiver empunhando. Assim, externamente, você pode criar estratégias de cooptação (unindo-se a outros profissionais) ou pode criar estratégias de eliminação (destruindo seus concorrentes). Internamente, você pode potencializar seus próprios dons (o marketing jamais utilizaria esse termo, mas, eu sim!) ou você pode criar um alterego assim como fez o personagem do filme O médico e o monstro (1886).
Eu não sou contra a prática do marketing pessoal (ou da versão bem mais complexa que é a gestão da marca pessoal); eu até mesmo a divulgo a qualquer pessoa que pretenda ter um mínimo de controle sobre sua carreira. O que eu quero é tentar despertar a consciência (a minha, em primeiro lugar) frente à maneira como integramos nossa vida profissional à nossa vida pessoal (que inclui nossos princípios e valores).
Uma das muitas máximas do marketing é “conheça muito bem as forças e as fraquezas da sua empresa”. Na cadência, o marketing pessoal diz: “conheça muito bem suas qualidades e seus defeitos”. A dualidade que eu ressaltaria nesse aspecto está na maneira de lidar com o que seriam suas fraquezas. Eu perguntaria: sob que ponto de vista? Pense que os tais defeitos são assim classificados pelo mercado de trabalho. Mas eles são defeitos de caráter? Você pode ser uma pessoa que prefere não entrar em discussões acirradas e ser taxada como despreparada profissionalmente porque não sabe se impor. O que aconteceria se, na elaboração de suas estratégias de marketing pessoal, você definisse que precisa desenvolver sua agressividade? Isso iria contra ou a favor de seu jeito natural de ser? Por outro lado, superar a timidez para enfrentar uma entrevista pode significar uma evolução pessoal importante que trará benefícios para a relação social cotidiana. Percebe como essa dualidade deve ser considerada cuidadosamente?
A nossa marca pessoal teria duas vertentes: a identidade da marca (valores e atributos que desejamos passar para o mercado de trabalho); a imagem de marca (a maneira como somos vistos pelos empregadores). A gestão da marca pessoal prediz que devemos garantir a coesão entre o que desejamos parecer ser e o que as pessoas enxergam de nós. Ops! (ops, mais uma vez), aí mora o perigo… O quanto estamos dispostos a modificar nosso modo de ser para que sejamos aceitos no mercado de trabalho? O marketing pessoal perguntaria: que adequações no produto (nesse caso, o ser humano!) você deverá fazer para que sua imagem como profissional alcance viabilidade de venda? Aí está a grande brecha para a prática da reificação: você coisificado para ser mais bem utilizado no mercado. O quanto você está disposto para deixar de ser você mesmo e passar a ser uma marca?
Agora, imagine que você realmente trabalha com aquilo que te agrada (Sim! Por incrível que pareça, há pessoas nessa situação sim). Nesse caso, você estará muito perto de ser um produto autêntico: oferecerá o que há de melhor em você. Os ajustes seriam minúcias que não violentariam a sua essência. O mercado terá segurança ao comprar você, pois não levará “gato por lebre”.
Não quero chegar a uma conclusão calcificada. Lancei reflexões. A obra de Bender é recomendável e o autoconhecimento, mais ainda! Praticar os preceitos do marketing requer olhar sistêmico para que possamos dar conta de prever todas as possibilidades de movimentação no tabuleiro do mercado e suas respectivas implicações. Para aquele que pretende entrar nesse jogo, eu recomendaria: seja responsável!
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Foto by Marcos Lalli
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