Como já é tradição nessa época do ano, a Apple lançou seu mais novo comercial de Natal. Em anos recentes, a empresa produziu algumas das mais belas peças de publicidade, com produção impecável e sempre com uma mensagem bastante apropriada para a ocasião.
Um parêntese: você que começou a ler este artigo e já está pensando em todo o caminhão de reclamações (merecidíssimas, na sua opinião e de mais um monte de gente) nos comentários, peço — ou melhor, suplico — humildemente que economize suas energias para as discussões pró/contra Bolsonaro, das quais deixei de participar, pois lá serão melhor aproveitadas.
Não é de hoje que as empresas se desdobram para criar uma mensagem positiva no Natal (ou para as “Festas”, como o politicamente correto demanda, uma vez que não exclui outras correntes de pensamento diferentes do Cristianismo). Muitas empresas escolhem essa época do ano para reforçar suas imagens, para fortalecer sua marca, passando uma mensagem que ressoe com os ideais de quem assiste. É uma estratégia boa, que ajuda a manter a empresa na mente do espectador e proporciona uma imagem positiva para o ano que vem pela frente.
A estratégia em si não faz milagres, obviamente: qualquer empresa envolvida na operação Lava-Jato, por exemplo, só faria cair no ridículo se tentasse passar uma imagem de paz por meio de um comercial de Natal. Esse tipo de publicidade não ressuscita os mortos da opinião pública.
A Apple já vem adotando essa estratégia há muito tempo, mas o comercial que mais ressoou entre fãs e detratores da empresa nos últimos tempos foi a peça de 2013, na qual vemos um adolescente “grudado” em seu iPhone logo que chega na casa dos parentes para a festa de Natal. Várias atividades são mostradas em que os jovens e adultos da família estão interagindo, e o moleque lá, grudado, absorto, inatingível. Na manhã seguinte, a surpresa. Se ainda não viu, veja (e se já viu, veja de novo):
https://www.youtube.com/watch?v=v76f6KPSJ2w
No ano seguinte, 2014, uma junção do velho com o novo. Uma neta descobre no fundo de um baú um pequeno disco compacto gravado pela avó como presente para o avô, ausente por conta da guerra. A jovem decide fazer uma homenagem à avó, inserindo-se na música e instrumentando a canção. O resultado é poético e a mensagem é um pedido para que nos lembremos de quem realmente importa:
Em 2015, os cantores Stevie Wonder e Andra Day fazem um apelo subliminar à inclusão, com uma belíssima canção em meio a crianças brincando na noite de véspera:
Em 2016, um pouco mais de humor, e mais uma bela chamada à inclusão, com o monstro de Frankenstein puxando um canto de Natal na praça da cidade:
https://www.youtube.com/watch?v=K1kl7qJDmw4
Em 2017, a Apple mudou um pouco a estratégia, focando no romantismo seu comercial de Natal. Em que pese ser uma peça plasticamente irretocável, com coreografia, música, iluminação, edição e tudo mais perfeitos, o “espírito” do Natal ficou meio que à margem. Como sempre, muita gente amou, muita gente odiou:
https://www.youtube.com/watch?v=P2toybKFkDo
O que nos traz a esse ano. Recentemente lançado, o comercial é uma inovação em vários sentidos. O mais óbvio deles: ao invés de filmar um comercial com atores, a Apple decidiu por produzir uma animação que combina estilo da Pixar (caracteres animados em 3D) com cenários reais de stop-motion (o resultado visual é estupendo). Outra mudança foi a inclusão — ainda que sutilmente — de outros produtos na peça, deixando como mensagem subliminar que os dispositivos da empresa trabalham em harmonia com diferentes aplicativos de software. Mas a mais importante das mensagens está no centro do comercial. Nela vemos uma jovem como milhões de outras, com rotina de trabalho, com vida cotidiana, uma pessoa como outra qualquer. De noite, em seu apartamento, ela dedica parte de seu tempo a criar pequenas peças impressas, que guarda em uma caixa. Não vemos o resultado de suas criações, mas percebemos a frustração consigo mesma que cada criação lhe proporciona. Ela cria, passa alguns segundos observando, e rapidamente guarda em sua caixa. O que aconteceria se algo (ou alguém) interferisse e essas criações não ficassem mais presas em uma caixa? Veja:
https://www.youtube.com/watch?v=3dJCroCMBPM
O comercial é uma chamada muito bonita a compartilharmos nossa capacidade criativa. Seja com um dispositivo da Apple ou de outra empresa — ou mesmo seja com uma caneta e papel, com uma caixa de fósforos, com a própria voz, ou como for — o que importa é: nós somos seres criativos. Nossa molecada sabe muito bem disso, e não hesita em nos mostrar suas pequenas produções, que orgulhosamente penduramos no refrigerador, nossa galeria residencial. Mas à medida que crescemos, ganhamos mais consciência de nós mesmos, e passamos a ser nossos mais severos críticos.
- O poema que escrevi? Besta.
- A foto que tirei? Mal enquadrada, mal iluminada. Chata. Quem vai querer ver mais uma foto de flor?
- As opiniões que tenho sobre o filme que acabei de assistir? Imagina… não tenho nada de valor para dizer sobre esse filme, não.
- A música que tirei no violão? De jeito nenhum! Do jeito que eu desafino…
- A coreografia que inventei para uma música que amo? Nem vem…
- A ideia que tive para uma história com base em uma cena que presenciei na rua? Você está maluco? E eu lá sou capaz de escrever alguma coisa que não seja lista de supermercado?
E por aí vai.
A peça da Apple nos pede para que compartilhemos nossas capacidades criativas, sem julgá-las, sem as suprimir.
Nós, aqui do Confrariando, acreditamos muito nessa mensagem, tanto que criamos esse site, que usamos para colocar para o mundo o que nos vem à cabeça a cada semana. E mais: recentemente expandimos nossas possibilidades criativas por meio de uma conta no Instagram, onde vários de nossos confrades estão compartilhando suas fotografias. Já conhece? Se não conhece, vá lá conhecer.
Noves fora, a mensagem vale para o Natal ou para qualquer outra época do ano. Em um momento em que somos chamados a voltar nossos olhos para nossos entes queridos — familiares e amigos — que maneira mais pessoal e terna de demonstrarmos nosso carinho do que por meio de algo que nós mesmos produzimos? Sim, claro que adoraríamos dar um celular caro e de última geração a todos os que amamos, mas esse não é o ponto do Natal (ou das Festas em geral). O ponto é nos expressarmos de maneira genuína. O ponto é dizermos: “carregue um pouco de mim junto com você, um pouco do que eu fiz, e fiz pensando em você”.
A mensagem que deve ficar é essa. E é uma boa mensagem.
Excelente retrospectiva Apple Natalina! Bela mensagem.
Caríssimo Confrade Ruy, você foi um verdadeiro porta-voz do Confrariando nesse fechamento de ciclo. Que todas as comemorações de final de ano nos levem ao melhor de nós mesmos, pois, assim, juntaremos o melhor de nós todos, certo?
Texto muito bem produzido como sempre! E o comercial! Que comercial top. Aquele pente na caixa gente! E a felicidade que ela desperta pela obra! Muito bom.