Tua beleza é perfeita. Tua perfeição perene.
Perenidade se fores intocável. Intocável se não fores viva.
Vivacidade na aparência. Perpetuação da não vida.
Perfeição de uma vida não vivida.
Porque és perfeita, intocável, perene e sem vida.
(FREGNI, C.P.)
É… realmente, as criações de Michael Zajkov me impactam profundamente a alma. A sensação da perfeição é desconcertante. Sabe aquele tipo de perfeição que não podemos tocar? Aquela perfeição que atrai e proíbe. Proibido o toque porque ele leva à descoberta do real, da imperfeição.
A atração que sinto pelas bonecas de Zajkov me remete à minha infância. Lembro-me de quando eu era presenteada com bonecas novinhas – cheirinho bom da borracha ainda não manuseada; cabelos intactos do nylon ainda não escovado. Que fascínio! Que vontade de tocar, abraçar, cheirar. Trocar as roupinhas, criar penteados, simular movimentos. E, assim, aquela perfeição tocada, manuseada, apalpada, transformava-se numa imperfeição de borracha manchada, nylon danificado e tecidos esfarrapados… A imperfeição da realidade!
Lembro-me de algumas mães que presenteavam suas filhas com bonecas que eram obrigadas a ficar intocáveis em armários com portas de vidro. Sim, a criança podia olhar suas bonecas, exibi-las às suas amiguinhas, mas era proibida de interagir fisicamente com seus presentes perfeitos. Isso poderia destruí-los.
Um dos primeiros aprendizados na infância: injetar vida é garantir o destino mortal a tudo que é vívido. Quanto mais vida eu tentava impor às minhas bonecas, mais as levava à degradação física. Era como se eu tivesse que escolher: a perenidade da beleza intocável ou a consumição consequente do vivenciar.
A ciência comprova que respirar nos leva à morte. A respiração envolve o processo da oxidação celular. Eis nossa escolha: não viver para não morrer ou caminhar rumo à morte porque, durante o trajeto, podemos viver intensamente.
Oh, bonecas de Zajkov! O que preferíeis?
A delícia da vida finita, ou a solidão da imortalidade?
A deterioração consequente de uma vida vivida?
Ou a morbidez de uma vida ilibada?
Não há beleza intacta na vida.
Porque a beleza da vida está na imperfeição.
(FREGNI, C.P.)
Então, quero seguir respirando profundamente, sendo apalpada pela vida, tendo meus cabelos desgrenhados pelo acordar, minha pele vincada pelo dia a dia, meu caminhar tropicado pelas pedras que piso. Porque escolho morrer a cada dia para que eu possa viver sempre. Que se oxidem minhas células porque a vida inspirada para dentro de mim é mais valorosa.
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