Existe toda uma poesia mórbida em doer. Eu, que nem gosto sequer de falar de dor, hoje necessito lançá-la para longe de mim. Escrever é meu caminho, minha cura, faço por necessidade pura.
Há dias em que tudo se mostra imóvel. Os mesmos barulhos, a mesma rotina, ou mesmo a falta dela. Tantos planos, tantos projetos, tantos sonhos, tanta vontade. E nada acontece. O nada, esse imbecil arrogante que insiste em me tomar pelos pés, sacudir e atordoar minha fé. Tem um nada silencioso que é bom, mas esse nada, do qual falo, é terrivelmente avalassador e horrível por existência. É saber que já está acontecendo e não ver. É sentir cada suspiro de satisfação das realizações, mas em sonho apenas. É um desespero tão grande de tudo, que sobra mesmo somente o nada.
Logo eu, tão repleta de força, garra, fé, hoje amanheci vazia. Tão plena de uma dor dilacerante de querer tudo o que sou e não alcançar coisa alguma. É tão desgastante o reflexo do outro não crendo em você mesma conseguir, só porque você amanheceu não crendo. A cólica de sentir tanta falta me faz perder a noção do tudo que já tenho. Não ligo para julgamentos dos outros, rio de cada um deles. Somente o meu próprio me condena por si só.
Sou grata sim, e como sou. Só há dias em que a gente acorda sem chão e pode, sim, se dar ao luxo de sentir essa dor, de deixar doer a tristeza até que ela se vá, assim por canseira. Hoje acordei assim e preciso falar para que isso se cure mais rapidamente.
É muito o tudo que tenho, só que por estar repleta de nada, desde que amanheci sem sol em mim, tenho o direito de gritar meu dia nublado em mim mesma, como quem anseia por um único e exclusivo raio de sol para querer voltar a sorrir.
Essa cólica, em não existir o que sou, me consome, destrói os sentidos e já não posso mais. A dor do ventre de uma mulher que está pronta para parir a vida e não consegue. Não falo de parir a vida humana, não essa ainda. Falo da vida que carrego na alma, que trouxe para doar ao mundo. É tanta vida que pulsa em mim, que dói se não circula, se não transborda, se não acontece. Essa sou eu, inteiramente emoção, toda água, coração e sensualidade de intensidade. A durabilidade exaustiva e eloquente de meu espírito, por vezes me pesa e eu não posso mais. Na verdade, posso e quero, mas não hoje.
Amanheci para chorar as dores da vida que não pari, da insanidade de amor que brota em meu peito e que ainda não consegui parir para o mundo, como é de meu direito e que tenho por dever. Para que ser tanto, afinal, se não é possível transbordar em mim e inundar o mundo onde estou agora?
A vida hoje está amarga, o café me adoça os sentidos, mas azeda minha ternura já tão inexistente no momento. Que se dane tudo, hoje quero derramar minhas lágrimas de não ser tudo o que posso, de não poder doar tudo o que desejo, de não poder receber absolutamente tudo o que mereço e que é meu por honra e sensatez.
Minha lógica latente me provoca risos descompassados de dor aguda, daqueles que nem num palco de Shakespeare seria possível sentir com tamanha franqueza. Mortais que somos, humana tão além da humanidade que sou e me reconheço. Faz parte doer. E ainda há a opção de sofrer ou não. E hoje eu sofro, porque quero.
Me deixe com minha dor, se vá com seu esse seu perfume insuportável de felicidade, suas certezas tão materiais, e carregue meu coração. Me deixe aqui vazia, que hoje sou toda drama, sou toda carne dilacerada, toda sangue que se esvai aos litros e sem controle. Me deixa sangrar até sarar. Me deixa chorar até secar essas lágrimas podres. Me deixa morrer nisso para renascer mais bela, forte e intempestiva, como sempre fui em todas as vidas. Não é o primeiro dia assim, tampouco será o último. Ainda bem que são bem poucos.
Sou Fênix. Renasço das cinzas, sempre. Só que hoje sou cinzas. Me deixa e se vá com suas certezas mentirosas, seu ar arrogante de quem também sofre, mas nunca diz. Eu digo. E é só.
Perfeito Dani!! Beijos
Gratidão, querida! Um beijo!